segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Violões e Atabaques no Despertar da Música Brasileira - Parte II

Em 1905, a repressão policial contra os grupos que promoviam as obscenas músicas proibidas - lundu, samba, maxixe - deu lugar a que se popularizasse uma antiga canção que dizia:

Eu vou beber/Eu vou me embriagar/Eu vou fazer barulho/Pra polícia me pegar/A polícia não quer/Que eu sambe aqui/Eu sambo ali/Sambo acolá

A palavra samba aparece aqui apenas no sentido de dança, mas o ritmo já começava a ser lançado. Quanto ao maxixe, continuava a ser "uma dança banida dos lares, por indecorosa", como informa o português João Chagas. "Contudo, muitas vezes, na casa brasileira" - diz Luiz Edmundo - "às escondidas do papai conservador e tradicionalista, as nossas sinhazinhas e sinhás não só cantam o que a canalha pela rua canta, como dançam também, umas com as outras, divertidas e alegres, os passos do corta-jaca ou do balão caído que aprendem pelos teatros que frequentam. É o fruto proibido saboreado à socapa, num despertar gostoso dos instintos da raça".

A difusão da música por todo o país foi apressada com o aparecimento do grammophone que a revista O Malho anunciava, em 1904, como "a maior novidade do século XX" e "o maior atrativo para as crianças". Surgiram então as primeiras e rudimentares gravações que reproduziam cançonetas interpretadas pelo Bahiano, e lundus de Mário Pinheiro, cantores muito apreciados pelo público que frequentava habitualmente os teatros e cafés-concerto da Capital Federal. Bahiano, cujo verdadeiro nome era Manoel Pedro dos Santos, gravou o primeiro disco brasileiro, Isto É Bom, número de ordem 1, no catálogo de 1902 da Casa Edison do Rio de Janeiro.

Isto é Bom (lundu, 1902) - Xisto Bahia - Interpretação: Bahiano


Art Nouveau, uma das primeiras gravações de Bahiano, de autor desconhecido, falava da nova moda recém-importada de Paris. A discografia do período também abria caminho para o sucesso de grandes compositores, como Ernesto Nazareth, Alberto Nepomuceno e o consagrado flautista Pattapio Silva. Este último gravou para a Casa Edison, em 1901, nada menos que oito discos.

Primeiro amor (valsa, 1904) - Pattapio Silva


Enquanto isso acontecia com a música popular, na esfera da música erudita surgiram algumas figuras de relevo. Se logo no princípio do decênio perdiamos Leopoldo Miguez (1902) - de todos os nossos compositores o que mais se deixou levar pelo fascínio de Wagner - receberiamos, em 1903, a importante contribuição de Henrique Oswald, desde ano diretor do Instituto Nacional de Música, e autor de obras intimistas como a Sinfonia opus 43, de 1910. No ano do quarto centenário da descoberta do Brasil (1900), foi levada à cena a ópera Jupira, de Francisco Braga, inspirada na novela homônima de Bernardo Guimarães. Nesse primeiro decênio, Braga tornou-se muito popular pela composição do Hino à Bandeira, com versos de Olavo Bilac.


Mas a figura mais expressiva de compositor erudito nacional do período é sem dúvida o cearense Alberto Nepomuceno. Desde 1897, com a Série Brasileira (Alvorada na Serra, Intermedio, Sesta na Rede e Batuque), dera ele prosseguimento -  na direção de certa música de intenção nacionalista - às tentativas que o paulista Alexandre Levy havia esboçado, em 1890, com o Tango Brasileiro e o Samba. Durante a Exposição Nacional de 1908, Nepomuceno regeu pela primeira vez no Brasil obras de novos autores estrangeiros como Smetana e Debussy.





sábado, 28 de janeiro de 2012

Violões e Atabaques no Despertar da Música Brasileira - Parte I

As toadas de violão, a modinha, o maxixe e a serenata eram a música do povo. Nos salões elegantes dançava-se valsa e polca, e cantavam-se árias de ópera. Somente nos ambientes de "gente mais esclarecida", povoados de escritores e jornalistas, é que a modinha e a serenata faziam a sua aparição lamurienta e plangente.

Somente em 1905 o maxixe começou realmente a tomar conta dos salões do Rio de Janeiro e passou a ser aceito pelas famílias de classe média. Logo, o maestro de teatro José Nunes compôs o Maxixe Aristocrático, cantado pela dupla de atores Pepa Delgado e Alfredo Silva, na revista "Cá e Lá".


Maxixe Aristocrático (maxixe, 1905) - José Nunes - Interpretação: Pepa Delgado e Alfredo Silva.



"De dois gêneros" - afirma o jornalista Luiz Edmundo - "são as serenatas que se fazem entre nós: a serenata de cantigas e a que se denomina choro. Na primeira avulta a voz humana ferindo a melodia (...). No choro, o caso é diferente, a voz humana não se escuta e só os instrumentos é que criam (...). No repertório dos chorões estão as valsas langorosas de Francisca Gonzaga, os sincopados tangos de Ernesto Nazareth", além de outros gêneros de música. Abaixo, o tango Favorito, de Ernesto Nazareth:


Favorito (tango, 1895) - Música de Ernesto Nazareth

Amor Avacalhado - Letrista desconhecido - Interpretação: Francisco Alves



Alguns compositores eruditos passaram a inspirar-se nessa música popular, fundindo-a com formas musicais europeias. Foi assim que o carioca Ernesto Nazareth criou o tango brasileiro, mesclando elementos do choro com a valsa. E sua música começou a ser executada em bailes e nas salas do cinema mudo.

Mais ligada ao teatro, a compositora Chiquinha Gonzaga (Francisca Edwiges Neves Gonzaga), famosa por suas polcas de salão inspiradas nas serenatas, musicou libretos de Arthur Azevedo e outras obras, num total de 77 peças teatrais. Numa época de rígido patriarcalismo, Chiquinha Gonzaga destacou-se por seu feminismo e por suas idéias avançadas. Para o cordão carnavalesco Rosa de Ouro, a compositora criou uma das mais célebres músicas de carnaval, a marcha Abre Alas, de 1899. Em 1901, todo o Rio de Janeiro cantava com ela: Ó abre alas/Que eu quero passar/Eu sou da lira/Não posso negar.

Ò Abre Alas (marcha-rancho, 1901) - Chiquinha Gonzaga - Interpretação: Marlene, Emilinha Borba e Ângela Maria


A aproximação de compositores considerados "sérios" à música cantada e dançada nos morros e cortiços começava a abrir para a música popular o caminho dos salões. O carnaval, na época chamado "entrudo", era o grande campo de provas democrático que tendia a nivelar, momentaneamente, todas as classes sociais num vasto oceano ondulante e suarento a gingar e requebrar-se ao som da música plebéia e ao ritmo do atabaque. No Rio, vibrantes e dourados cordões e blocos, envoltos em serpentinas e sob chuvas de confetes, percorriam a rua do Ouvidor cantando em coro: Viva o Zé Pereira/Que a ninguém faz mal/E viva a bebedeira/Nos dias de carnaval! 

Cena do Carnaval de 1905. Abaixado, de gravata, o compositor Sinhô

E o desfile continuava, clubes e cordões sucedendo-se em intermináveis demonstrações: Cordão Rosa de Ouro, Tenentes do Diabo, Fenianos, Filhos da Primavera, Democráticos. Em 1907, surgiu a Sociedade Carnavalesca Ameno Rezedá, que marcaria toda uma época de carnavais. Dançava-se muito o maxixe, primeira dança urbana brasileira, que nascera por volta de 1870 como resultado da mistura da polca com o lundu, este último uma dança africana quente e sensual, cujo clímax era a célebre umbigada, tão condenada quanto invejada pelas famílias de classe média para cima. Essas famílias, que apreciavam o maxixe nos teatros de revista, chamavam a polícia, quando o viam ser dançado nas ruas. 


Outro gênero musical muito executado era o tango brasileiro, variante mais bem comportada do maxixe. Havia ainda polcas, quadrilhas e até mesmo valsas. A irreverência e a sátira política já começavam a irromper nas músicas carnavalescas. Em 1909, por exemplo, a música mais cantada foi a polca No Bico da Chaleira, de Juca Storoni (maestro Costa Júnior), satirizando a bajulação política e criando o termo "chaleirar", que por muito tempo foi sinônimo de "puxa-saquismo".

No Bico da Chaleira (polca, 1909) - Juca Storoni


Iaiá / me deixa subir esta ladeira / Eu sou do bloco / Mas não pego na chaleira / Na casa do Seu Tomaz / Quem grita / é que manda mais / Que vem de lá / Bela Iaiá / Ó abre alas / Que eu quero passar / Sou Democrata / Águia de Prata / Vem cá mulata / Que me faz chorar 

As mulatas já eram símbolos eróticos e musas dos carnavais. Vem Cá, Mulata, tango-chula de Arquimedes de Oliveira com versos de Bastos Tigre, popularizou-se imediatamente em 1906. Três anos antes, o grande sucesso do carnaval foi a cançoneta Quem Inventou a Mulata, de Ernesto de Souza

Vem Cá Mulata (tango-chula, 1906) - Arquimedes de Oliveira e Bastos Tigre - Interpretação: Os Geraldos


No ano seguinte, 1904, o Rio inteiro cantou a polca Rato, Rato, de Casemiro Rocha e Claudino Costa, ironizando a campanha de Oswaldo Cruz pela erradicação do temido roedor.

Rato, Rato (polca, 1904) - Casimiro da Rocha - Interpretação: Ademilde Fonseca


Rato, rato, rato?Por que motivo tu roeste o meu baú/Rato, rato, rato/Aldacioso e malfazejo gabiru...


Fonte I: Nosso Século (1900/1910 - Parte II)
Fonte II: Cifra Antiga - http://cifrantiga3.blogspot.com/

Continua...

sexta-feira, 27 de janeiro de 2012

A Casa Edison


Frederico Figner
13 de novembro de 1889. Na presença do imperador D. Pedro II, da princesa Isabel e seu marido, o conde D’Eu, um de seus filhos, o príncipe do Grão-Pará, falou e o outro, o príncipe D. Pedro Augusto, solfejou. Era a primeira gravação de sons feita no Brasil, ao ser apresentado à Corte o grafofone (modelo mais avançado de Thomas Edison para seu gramofone). Portanto, D. Pedro Augusto foi o primeiro brasileiro a ter sua voz gravada, cantando.

O Brasil foi dos primeiros países a ter a novidade do final do século XIX – a máquina que aprisionava sons -, já que em 1878, um ano apenas depois de ter registrado sua invenção, Edison receberia autorização do imperador para comercializar a aparelho no país.

A princípio a coisa foi atração de feira, circense, teatral, sendo exibida por camelôs onde encontrassem espaço para reunir meia dúzia de embasbacados cidadãos dispostos a pagar um níquel para ver e ouvir aquela incrível máquina falante. Saída das páginas da ficção registraria poderosa influência na cultura de todos os povos.
Em 1900: anúncio das últimas novidades em aparelhos
No Brasil, o primeiro a se interessar comercialmente pelas máquinas falantes foi o imigrante tchecoslovaco, de origem judaica, Frederico Figner. Menino, emigrou para os Estados Unidos e lá, já adulto, ao tomar conhecimento da invenção, que ainda funcionava de forma primitiva com rolos de cera e deixava de ser curiosidade para se transformar em atividade comercial, comprou um fonógrafo, com alguns rolos de cera, e saiu a exibi-los pelas Américas. De volta àquele país resolve explorar um mercado virgem e parte rumo ao Brasil, onde entra por Belém do Pará no final de 1891. Percebendo o sucesso de suas apresentações, envereda pelo Ceará, Paraíba, Pernambuco, Rio Grande do Norte, Bahia e dá com os costados no Rio de Janeiro, em abril de 1892. 






Instala-se na Rua do Ouvidor, 135, com sua “machina que falla”, como anunciavam os jornais, sem saber que iria interferir profundamente na cultura popular do país que escolhera ao acaso para ganhar dinheiro.

Das sessões diárias para a apresentação da novidade até perceber a mina de ouro, Fred Figner – como se tornou conhecido – foi um passo. Importa e comercializa aparelhos e cilindros que vendem como água, pois eram encontrados com vários preços, acessíveis e sofisticados. Com a sua famosa Casa Edison era o dono absoluto do mercado.

Mas, nos últimos anos do século XIX, começa a enfrentar concorrência e sua criatividade é chamada para manter a liderança. Até então se vendiam cilindros de música estrangeira, importados. Fred convida os cantores Cadete (Antonio da Costa Moreira)Bahiano (Manuel Pedro dos Santos) para gravar fonogramas brasileiros, ganhando um mil-réis por cilindro. Mais tarde o palhaço Eduardo das Neves (Dudu), famoso por seus lundus e canções, veio juntar-se à dupla. Com isso o pioneirismo foi acrescido à biografia de Fred Figner, o de profissionalizar a música popular no Brasil.

Em 1904 entra no mercado o gramofone, com discos de cera cuja reprodução do som era feita através de uma agulha metálica presa a um diafragma de mica, que Émile Berliner lançara. Fred Figner garante para si, através de contrato com a International Zonophone Company, o direito de fabricação de chapas prensadas dos dois lados, o disco, que em muito pouco tempo eliminaria o sistema de gravações por cilindro. Surgem as séries Zon-O-Phone 10.000 e X-1000 que podem ser consideradas as primeiras do disco brasileiro. 

O sistema de gravação era mecânico, obrigando o intérprete a cantar gritado na boca de uma enorme corneta. O “técnico de som” tinha que empurra-lo à frente pelos ombros nas notas graves, ou puxa-lo para longe, nas notas agudas. Quando gravavam bandas ou conjuntos, os músicos se amontoavam na frente do “microfone”. Depois da gravação, a cera era enviada para a Alemanha e voltava transformada em disco seis meses mais tarde.
O enorme repertório do cantor Bahiano na Edison
Mais tarde Figner fundou filiais em São Paulo e Porto Alegre, montando um estúdio na capital gaúcha, onde registrou artistas locais como o cantor modinheiro Xiru e o grupo de choro Terror dos Facões.

Em 1911, associando-se à Odeon, pertencente à firma holandesa Transoceanic, Figner importa o equipamento da Alemanha e instala no Brasil a primeira fábrica de discos, a Odeon, no bairro da Tijuca, Rio de Janeiro, e mantém a liderança até 1924, quando a Victor Talking Machine cria o processo de gravação elétrica, do qual o cantor Francisco Alves seria o pioneiro no Brasil em 1927.

Em 1930, a Transoceanic obrigou Figner a vender todo o patrimônio da Casa Edison, dominando, a partir de então, o processo de gravação no Brasil, ao lado de outras multinacionais, como a Columbia e a RCA Victor. Com 40 mil títulos lançados ao longo de 28 anos, a Casa Edison marca a etapa heróica da gravação de discos no Brasil. A empresa funcionou até os anos 50, mas mudou de ramo: abandonando as máquinas falantes, passou a comercializar mimeógrafos e máquinas de escrever.


Fonte: http://cifrantiga3.blogspot.com/2006/03/casa-edison.html#ixzz1keXoW2zN



quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Tico-Tico No Fubá (1917)


Tico-tico
Tico-tico
O tico-tico tá
Tá outra vez aqui
O tico-tico tá comendo meu fubá
O tico-tico tem, tem que se alimentar
Que vá comer umas minhocas no pomar

Tico-tico
O tico-tico tá
Tá outra vez aqui
O tico-tico tá comendo meu fubá
O tico-tico tem, tem que se alimentar
Que vá comer umas minhocas no pomar

Ó por favor, tire esse bicho do celeiro
Porque ele acaba comendo o fubá inteiro
Tira esse tico de cá, de cima do meu fubá
Tem tanta coisa que ele pode pinicar
Eu já fiz tudo para ver se conseguia
Botei alpiste para ver se ele comia
Botei um galo, um espantalho e alçapão
Mas ele acha que fubá é que é boa alimentação

O tico-tico tá
Tá outra vez aqui
O tico-tico tá comendo meu fubá
O tico-tico tem, tem que se alimentar
Que vá comer é mais minhoca e não fubá

Tico-tico
O tico-tico tá
Tá outra vez aqui
O tico-tico tá comendo meu fubá
O tico-tico tem, tem que se alimentar
Que vá comer é mais minhoca e nao fubá

segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

A Primeira Geração da MPB (1901/1930)

Num Post recente (Seis Compositores e Um Intérprete - 09/01/2012), apresentei alguns membros da "primeira geração" da MPB: Carlos Gomes, Chiquinha Gonzaga, Ernesto Nazareth, Catulo da Paixão Cearense, Vicente Celestino, Pixinguinha e Francisco Alves). Em seguida, comecei a apresentar pequenas biografias de alguns deles: Carlos Gomes, Chiquinha Gonzaga, Ernesto Nazareth e Catulo da Paixão Cearense.

Esses quatro seriam os seniores, ou os precursores, se assim preferir meu nobre leitor (ou leitora). Mas, eles não chegaram a "alcançar" a Era do Rádio...


Explico: MPB significa Música Popular Brasileira. E a música só se popularizou, no Brasil, com o advento do rádio. Antes dele, haviam apenas as vitrolas, as quias pouca gente tinha acesso. Além de caras, havia o preço (extra) dos discos de cera, que nem duravam tanto assim. Então, música era algo que ou se ouvia ao vivo, ou raramente, gravada. Por isso, dificilmente a música era popular...

A primeira transmissão de rádio, no Brasil, ocorreu em 1922. Nesse ano, Carlos Gomes já tinha falecido, Chiquinha Gonzaga tinha 75 anos, Ernesto Nazareth e Catulo da Paixão Cearense tinham 59...

Nessa época, a "segunda geração" ainda não tinha entrado em ação. Assim, ouvia-se principalmente música clássica, e uns poucos artistas, com os já citados, além de artistas estrangeiros, como Billy Murray (1877/1954), W. C. Handy (1873/1958), Enrico Caruso (1873/1921) e Al Jolson (1886/1950), entre outros...

Nicolau Sevcenko, em seu texto A Capital Irradiante: Técnica, Ritmos e Ritos do Rio (História da Vida Privada, Vol. 3), informa que o rádio foi chamado, nessa época, de "capelinha", por causa de seu formato lembrando justamente as "capelinhas" que iam de casa em casa, para oração (como é até hoje):

Era um modo de remeter a um recôndito familiar das tradições e das memórias um artefato moderno e de efeito arrebatador. Cada um põe naquela voz aliciante o rosto e o corpo dos seus sonhos. Como o som se transmite pelo espaço, onde quer que se ande pela casa, aquela voz penetrante vai atrás.


Entre 1922 e 1930, entretanto, se multiplicaram as "rádio clubes", sociedades onde as elites emprestavam seus discos para tocar na rádio. Assim, poucos tinham aparelho em casa, e os que tinham, ouviam o que seus pares podiam oferecer...E a indústria fonográfica nacional mal existiu. Quem dirá o surgimento de novos nomes...abaixo, alguns deles:

1) Xisto Bahia (1841/1894): cantor e compositor nascido em Salvador, Xisto de Paula Bahia começou a compor modinhas e lundus e fazer sucesso, já aos dezessete anos, e se apresentando pelo interior do país. Chegou ao Sudeste, se apresentando até para Dom Pedro II. Quando foi inaugurada a Casa Edison, primeira gravadora do Brasil, Xisto compôs o lundu Isto é Bom (1902, abaixo). Essa música foi grava pelo cantor Bahiano, no primeiro disco gravado no Brasil:


2) Donga (1890/1974): Ernesto Joaquim Maria dos Santos nasceu no Rio de Janeiro e era filho de Tia Amélia, uma das baianas que promoviam festas em suas casas (outra era Tia Ciata). Aos 14 anos, começou a tocar cavaquinho, e depois passou para o violão. Foi numa dessas festas que surgiu Pelo Telefone (1917), que Donga tratou de registrar como de sua autoria, identificando-o como samba. Assim, ele é considerado autor do primeiro samba brasileiro. Junto com Pixinguinha, integrou a banda Os Oito Batutas, que em 1922 chegou a se apresentar na Europa.


3) Sinhô (1888/1930): José Barbosa da Silva é considerado um dos grandes compositores de antigamente. Se casou cedo, com uma portuguesa, aos 17 anos, e trabalhou duro para sustentar os três filhos. Mesmo assim, não perdia uma festa na casa da Tia Ciata. Quando Donga registrou Pelo Telefone como sendo de sua autoria, Sinhô foi um dos que contestou, dizendo que a música se chamava O Roceiro e era sua. A briga virou música, sendo que Pixinguinha compôs Já Te Digo. Em resposta, Sinhô compôs a primeira marchinha da História, chamada O Pé de Anjo (abaixo, em gravação de 1950 - Blecaute). Depois compôs Fala Baixo (1921), que ofendeu o Presidente Artur Bernardes, obrigando-o a fugir. Deu aulas de violão a Mário Reis, que depois interpretou seus dois maiores sucessos: Jura (1928) e Gosto Que Me Enrosco (1928). Faleceu em 1930, vítima da tuberculose, mas ganhou o título de Rei do Samba:


4) Zequinha de Abreu (1880/1935): José Gomes de Abreu nasceu em Santa Rita do Passa Quatro (SP) e se destacou por suas composições tocadas em flauta, sua especialidade. Ficou conhecido pela sua composições Tico-Tico no Fubá (1917), que foi imortalizada por Carmen Miranda:





terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Catulo da Paixão Cearense (1863/1946)




Perfil

O tempo reconhece e perpetua. Assim foi com Catulo da Paixão Cearense, homem de muitos inimigos e adorado pelo povo. Inimigos porque desfiavam dele um rosário de mal versão que ia do vaidoso, passando pelo mulherengo, até chegar ao cabotino. Adorado por ter sido um dos poucos, talvez o único, poeta popular no Brasil que, em vida, recebeu todas as glórias, todas as honras e uma adoração popular tão grande.


Isso porque Catulo usou e abusou de toda a sonoridade que o sotaque nordestino lhe proporcionou, soube colocar em versos simples onde era o lugar de por versos simples. Tinha faro. Sabia ouvir, como ninguém mais, o rumor da terra. Catulo da Paixão Cearense era maranhense de São Luís, onde nasceu em 8 de outubro de 1863. Ainda menino, Catulo, com 10 anos, mudou-se com o pai, o ourives e relojoeiro Amâncio José da Paixão Cearense, a mãe, Maria Celestina Braga da Paixão e os irmãos, para o sertão do Ceará. Esse tempo que ficou no Ceará deixaria marcas profundas que, posteriormente, se converteriam em poesias e canções de rara beleza e de apurado trabalho de registro da língua brasileira, isto é, aquela escrita do jeito que se fala e que serviria de inspiração para o tema de sua mais conhecida peça: Luar do Sertão. Aliás, essa melodia, gravada nos primeiros anos deste século, época em que a indústria fonográfica engatinhava, custou alguns problemas ao seu autor: apesar de Catulo negar sempre, existe a possibilidade de que a melodia tenha sido adaptada pelo violonista João Pernambuco a partir de um tema folclórico nordestino. Mas, fato é que esta canção, composta originalmente com 10 estrofes com rimas emparelhadas, recebeu, além de inúmeras outras gravações nos mais diversos estilos, a consagração popular, a ponto de ter sido chamada de segundo hino nacional.


Em 1880, com 17 anos de idade, sua família mudou para o Rio de Janeiro que começava a substituir Salvador como principal cidade brasileira. O poeta adotou a cidade e criou problemas com o pai. Por essa época Catulo tocava flauta e travou conhecimento com algumas pessoas que moravam numa república. Essas pessoas eram Antônio Calado e Viriato, flautistas, Anacleto de Medeiros e Quincas Laranjeiras, que, exímio violonista, ensinou Catulo tocar violão. Daí para a boemia e as serenatas foi um pulo. É também dessa época a sua primeira modinha, Ao Luar:


Vê que amenidade/ que serenidade/ tem a noite em meio/ quando em brando enleio/ vem lenir o seio/ de algum trovador...


E, em seguida, o velho Amâncio espatifa um violão na cabeça do filho. Ele seguira-o e, desaprovando o comportamento de Catulo, resolvera castigá-lo. Tempos depois, Catulo tocaria violão e declamaria – e violão ainda era um instrumento maldito pela sociedade – no Palácio do Catete para a mais seleta platéia da República Velha. Nair de Tefé, esposa do Presidente Hermes da Fonseca (e amiga de Chiquinha Gonzaga) disse, de sua apresentação em 1914:


Essa audição de Catulo, no Palácio do Catete, constituiu o maior sucesso a que um verdadeiro artista poderia aspirar em toda sua vida. Catulo, ao término de cada canção que interpretava, recebia da culta assistência uma ovação delirante. Todos o aplaudiram de pé...


Também é dessa época uma história contada pelos seus inimigos envolvendo Catulo e Rui Barbosa: dizem que Catulo encontrou um amigo na rua e falou:


"acabo de sair da casa do ministro Rui Barbosa. Recitei o meu Hino às Aves e o baiano chorou. Só hoje é que vim a ter certeza de ele é realmente um gênio".

Em 1906, o cantor Mário Pinheiro (1880-1921) grava Talento e Formosura para a Casa Edson, de Fred Figner & Cia., a pioneira do mercado fonográfico do Brasil. No mesmo ano, grava também Resposta ao Talento e Formosura; em 1907. O Que Tu ÉsAté As Flores Mentem e Célia; em 1909, Choça ao Monte e Cabocla Bonita; em 1910, Adeus da Manhã e a grande criação de Catulo: Luar do SertãoSobre esta melodia falou-se que, como Luar do Sertão, teria sido adaptada de tema folclórico, mas fato é que esta música, para tristeza de Catulo, que não queria ser sucesso assim, acabou virando sucesso no carnaval carioca de 1913.

Luar do Sertão (toada, 1914) - João Pernambuco e Catulo da Paixão Cearense



Não há, ó gente, oh não luar / Como este do sertão (bis)

Oh que saudade do luar da minha terra / Lá na serra branquejando
Folhas secas pelo chão / Esse luar cá da cidade, tão escuro
Não tem aquela saudade / Do luar lá do sertão (refrão)
A gente fria desta terra sem poesia / Não se importa com esta lua
Nem faz caso do luar / Enquanto a onça, lá na verde capoeira
Leva uma hora inteira, / Vendo a lua a meditar (refrão)
Ai, quem me dera que eu morresse lá na serra
Abraçado à minha terra e dormindo de uma vez
Ser enterrado numa grota pequenina
Onde à tarde a surunina chora sua viuvez (refrão).


***

Nos últimos dias de vida, Catulo morou num barracão na Rua Francisco Méier, hoje Rua Catulo da Paixão Cearense, no Engenho de Dentro, subúrbio do Rio de Janeiro. Ao barracão deu o nome de "Palácio Choupanal" e nele o poeta recebia velhos amigos, antigos companheiros da estiva e visitantes ilustres, entre eles, Monteiro Lobato, o poeta espanhol Salvador Rueda, o tenor e médico mexicano Alfonso Ortiz Tirado. Grande conversador, bom bebedor de cerveja, Catulo vivia sempre com a mesa cheia, e recebia as visitas de pijama e chinelos. Aliás, ele só conhecia dois trajes: ou o pijama ou o terno e gravata, nada de meios termos.


Catulo acabaria morrendo pobre a 10 de maio de 1946. Seu corpo foi embalsamado e o escultor Flory Gama modelou-lhe a máscara mortuária. Em depoimento para a História da MPB da Editora Abril, o seu amigo Carlos Maul contou que o enterro do poeta não foi um fato comum na cidades. "A banda do Corpo de Bombeiros ia tocando a Marcha Fúnebre e atrás da carreta com o corpo ia a massa popular. Quando o corpo chegou ao Cemitério São Francisco de Paula, no Catumbi, havia milhares de pessoas. Os discursos de personalidades fizeram com que a cerimônia entrasse pela noite. Uma lua imensa começou a luzir no céu e, espontaneamente, o tenor Alfonso Tirado começou a cantarolar Luar do Sertão. Em pouco milhares de vozes dominavam a noite".



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segunda-feira, 16 de janeiro de 2012

Ernesto Nazareth (1863/1934)




Ernesto Júlio de Nazareth nasceu no Rio de Janeiro (RJ), em 20 de março de 1863, e estudou música com os professores Eduardo Madeira e Lucien Lambert. Intérprete constante de suas próprias composições, apresentava-se como "pianeiro em salas de cinema, bailes, reuniões e cerimônias sociais. Entre 1920 e 1924, muitos personagens ilustres iam ao cinema Odeon apenas para ouvi-lo. Compunha, lecionava e vivia do piano. Suas partituras era vendidas aos milhares, mas não lhe garantiam a sobrevivência, pela falta de ordenamento dos direitos autorais. Em 14 de julho de 1886, casou-se com Teodora Amália de Meireles, e a ela dedicou a valsa Dora, inédita até então.

Brejeiro, composto em 1893, uma de suas composições mais famosas, é considerado o marco do tango brasileiro. Em razão de dificuldades financeiras, Nazareth vendeu os direitos dessa peça para a Editora Fontes e Cia. por 50.000 réis, o qual chegou a ser gravado pela banda da Guarda Republicana de Paris. Embora tenha composto obras as quais denominou de tango-brasileiro, Nazareth fazia uma diferenciação entre o choro e o tango-brasileiro, esta por ele considerada música pura. Seus tangos-brasileiros têm a indicação metronômica de M.M. semínima igual a 80 batidas, já no choro, a indicação é de 100 batidas. Para mostrar essa diferença, Nazareth compôs o choro Apanhei-te Cavaquinho (abaixo). Foi uma das únicas composições que ele considerou como choro. O mesmo entendimento tinham Chiquinha GonzagaAntonio Calado, Alexandre Levy e outros.




Em 1917 morre sua filha, Maria de Lourdes, considerado o primeiro abalo dos inúmeros pelos quais passou em sua vida. Nesse mesmo ano, atuou como pianista na sala de espera do Cine Odeon, que foi por ele inaugurado. As pessoas lotavam para ouvi-lo tocar, mais do que propriamente para ver o filme. Em 1910 já compusera o tango-brasileiro Odeon, inspirado naquele cinema. Em 1919 começou a trabalhar na Casa Carlos Gomes (mais tarde Carlos Wehrs). Executava as partituras que os fregueses se interessavam em comprar.

Compôs fox-trots, sambas e até marchas de carnaval, por um breve período, em 1920. Em 1922 interpretou Brejeiro, Nene, Bambino e Turuna no Instituto Nacional de Música, por iniciativa de Luciano Gallet. Participou como pianista, em 1923 da inauguração da Rádio M.E.C. (antiga Rádio Sociedade do Rio de Janeiro). Durante quase todo o ano de 1926 apresentou-se em São Paulo, capital e interior. Seus admiradores se uniram e deram-lhe um piano italiano de cauda Sanzin, que faz parte do acervo do Museu da Imagem e do Som, no Rio de Janeiro. Nessa ocasião, Mário de Andrade fez uma conferência sobre sua obra na Sociedade de Cultura Artística, de São Paulo, SP. Retornou ao Rio de Janeiro em 1927, já apresentando sinais da surdez. Em 1929, morre sua mulher, o que lhe provocou profundo abalo.

Gravou para a fábrica Odeon, em 1930, o tango-brasileiro Escovando e o choro Apanhei-te Cavaquinho. Em 1932, fez várias excursões, principalmente para o sul do Brasil. Com o agravamento da surdez, tocava debruçado sobre o piano para conseguir ouvir sua própria música. Em 1933, apresentou graves perturbações mentais e foi internado no Instituto Neurosifilis da Praia Vermelha, sendo posteriormente transferido para a Colônia Juliano Moreira.

No ano seguinte fugiu e foi encontrado, 4 dias depois, afogado em uma represa. Há uma lenda segundo a qual ele teria sido encontrado morto debaixo de uma cachoeira. A sua postura era impressionante. Estava sentado, com a água lhe correndo por cima, com as mãos estendidas, como se estivesse tocando algum choro novo, que nunca mais poderemos ouvir... (Juvenal Fernandes, in Ernesto Nazareth, Antologia, Ed. Arthur Napoleão Ltda. AN-2087/88). Dele, disse Villa-Lobos: "Suas tendencias eram francamente para a composição romântica, pois Nazareth era um fervoroso entusiasta de Chopin." Querendo compor à maneira do mestre polonês e não possuindo a capacidade necessária para uma perfeita assimilação técnica, fez, sem o querer, coisa bem diferente e que nada mais é do que o incontestável padrão rítmico da música social brasileira. De qualquer maneira, Nazareth é uma das mais notáveis figuras da nossa música.

Ernesto Nazareth significa uma caso raro de ligação entre o erudito e o popular: não é um erudito, na acepção da palavra, nem é um compositor apenas popular. Ora se percebe em sua obra um toque chopiniano, especialmente nas valsas, ora a vibração de uma polca ou de um choro entranhados do espírito brasileiro.

Somente uma pequena parte das mais de 200 peças para piano compostas por Ernesto Nazareth foi gravada. Suas composições mais conhecidas são: Apanhei-te Cavaquinho, Ameno Resedá (polcas), Confidências, Coração que Sente, Expansiva, Turbilhão de Beijos (valsas), Bambino, Brejeiro, Odeon (abaixo) e Duvidoso (tangos brasileiros).

In: http://cifrantiga3.blogspot.com/


Vídeo: Abertura da Novela "A Sucessora" (1978/1979), da Rede Globo, com a música "Odeon" na voz de Nara Leão (música de Ernesto Nazareth e letra de Vinícius de Moraes).




"Odeon" é dedicado à empresa Zambelli & Cia., dona do cinema homenageado no título, onde o autor tocou na sala de espera. Localizado na Avenida Rio Branco 137, possuía duas salas de projeção e considerado um dos "mais chics cinematógraphos do Rio de Janeíro". Em 1968, a pedido de Nara LeãoVinícius de Moraes fez uma letra para "Odeon":

Ai, quem me dera / O meu chorinho / Tanto tempo abandonado / E a melancolia que eu sentia / Quando ouvia / Ele fazer tanto chorar / Ai, nem me lembro / Há tanto, tanto / Todo o encanto / De um passado / Que era lindo / Era triste, era bom / Igualzinho a um chorinho/ Chamado Odeon.

Terçando flauta e cavaquinho / Meu chorinho se desata / Tira da canção do violão / Esse bordão / Que me dá vida / Que me mata / É só carinho / O meu chorinho / Quando pega e chega / Assim devagarzinho / Meia-luz, meia-voz, meio tom / Meu chorinho chamado Odeon

Ah, vem depressa / Chorinho querido, vem / Mostrar a graça / Que o choro sentido tem / Quanto tempo passou / Quanta coisa mudou / Já ninguém chora mais por ninguém / Ah, quem diria que um dia / Chorinho meu, você viria / Com a graça que o amor lhe deu / Pra dizer "não faz mal / Tanto faz, tanto fez / Eu voltei pra chorar com vocês"

Chora bastante meu chorinho / Teu chorinho de saudade / Diz ao bandolim pra não tocar / Tão lindo assim / Porque parece até maldade / Ai, meu chorinho / Eu só queria / Transformar em realidade / A poesia / Ai, que lindo, ai, que triste, ai, que bom / De um chorinho chamado Odeon

Chorinho antigo, chorinho amigo / Eu até hoje ainda percebo essa ilusão / Essa saudade que vai comigo / E até parece aquela prece / Que sai só do coração / Se eu pudesse recordar / E ser criança / Se eu pudesse renovar / Minha esperança / Se eu pudesse me lembrar / Como se dança / Esse chorinho / Que hoje em dia Ninguém sabe mais.


Fonte: A Canção no Tempo - Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello - Editora 34, in: http://cifrantiga3.blogspot.com/

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Chiquinha Gonzaga (1847/1935)

Por que [e importante conhecer Chiquinha Gonzaga? Somente por usas composições? Ou por sua vida, também? Vejamos...

Já em seu nascimento, temos um pouco de Brasil: seu pai era José Basileu Gonzaga, general do Exército Imperial Brasileiro e sua mãe era Rosa Maria Neves de Lima, uma negra muito humilde. Obviamente, José era branco e se casou com Rosa Maria mesmo contra a vontade da família, após o nascimento de Francisca Edwiges Neves Gonzaga, em 17 de outubro de 1847. Parece até o quadro Redenção de Can, de Modesto Brocos y Gómez (1852/1936), pintado em 1895:


O quadro fala por si só, sobre a questão racial, no Século XIX. E Francisca sentiu isso, apesar de ter pai branco. Provavelmente, seu pai quis lhe dar o melhor, apesar dela ser mestiça. Frequentou boas escolas, estudou o que uma moça deveria estudar, mas não se afastou de suas origens negras tanto quanto seu pai desejava. Mesmo assim, aos 11 anos compôs uma canção natalina, intitulada Canção dos Pastores (sua primeira composição).


Aos 16 anos (foto acima), em 1863, Chiquinha foi praticamente obrigada a se casar com Jacinto Ribeiro do Amaral, um oficial da Marinha Imperial brasileira. Óbvio que quem impôs esse casamento foi a família de seu pai. Aparentemente, a mãe de Chiquinha não "apitava" nada...

Mesmo assim ela se casou, e teve três filhos com Jacinto: João Gualberto, Maria do Patrocínio e Hilário. Mas o casamento ia de mal a pior, já que o marido vivia grande parte do tempo no mar, e a ela era proibido compor, sua paixão. Até que um dia, Chiquinha cansou, e resolveu sair de casa. Mas, como uma espécie de castigo, só pôde levar o filho mais velho, João. Os outros dois ficaram com o pai... Chiquinha lutou, mas perdeu. A sociedade patriarcal de então impunha "penas" às mulheres que ousavam desafiar o regime. E com Chiquinha não foi diferente. Mas ela era batalhadora, e não se deu por vencida.

Em 1867, aos 20 anos, Chiquinha reencontrou um grande amor do passado, o engenheiro João Batista de Carvalho, e teve com ele a quarta filha, Alice Maria. Mas ele a traía muito, e ela não aceitava isso. Resultado: perdeu outro homem em sua vida, e mais uma filha sendo criada longe. Mesmo assim, Chiquinha foi sempre presenta, na vida dos quatro filhos...

Assim, Chiquinha Gonzaga deu aulas de piano e escreveu muitas músicas, com as quais foi criando seu filho. E isso numa sociedade que humilhava mães solteiras e mulheres separadas, mas não condenava maridos ausentes e/ou adúlteros e violentos...Talvez daí esse olhar triste, numa foto tirada em 1877, quando ela tinha 30 anos:


Para completar os escândalos em sua vida, Chiquinha se apaixonou novamente: em 1899, aos 52 anos, ela se apaixonou por João Batista Fernandes Lage, um jovem musicista de 16 anos. Para evitar o falatório (que hoje não seria diferente), Chiquinha fingiu "adotá-lo", e foram morar alguns anos em Portugal, a fim de fugir da confusão que a situação iria causar...Esse romance só foi descoberto após a morte da compositora, no Carnaval de 1935. E João Batista estava ao seu lado, nesse momento derradeiro...

Na parte musical, destacamos apenas duas 77 peças teatrais e cerca de duas mil composições em gêneros variados: valsaspolcas,tangoslundusmaxixesfadosquadrilhasmazurcaschoros e serenatas: O Corta Jaca e Ó Abre Alas.

Ó Abre Alas (1899)

Música mais conhecida de Chiquinha Gonzaga. Aqui, numa gravação da Banda da Casa Edison, em 1913. Mesmo assim, é possível perceber os versos Ó Abre Alas, que eu quero passar...A canção foi feita para o cordão carnavalesco Rosa de Ouro, citado na letra. O sucesso é considerado a primeira marcha carnavalesca da história.


Corta Jaca (1904)


O Corta Jaca foi composto em 1904, quando Chiquinha Gonzaga estava na Europa. Quando ela foi, em 1902, tinha se tornado amiga de Nair de Tefé von Hoonholtz (1886/1981), a primeira mulher caricaturista do mundo. Na sua volta, em 1910, Nair casou com o Presidente Hermes da Fonseca. E foi assim que, em 1914, Chiquinha Gonzaga apresentou O Corta Jaca, em pleno Palácio do Governo, e teve o acompanhamento da Primeira-Dama ao violão. Na sociedade patriarcal de então, mais um escândalo, pois aquele ritmo era impróprio para aquele lugar, e a Primeira-Dama nunca poderia ter tido essa audácia...mas teve.


Além dessas já citadas, podemos citar:


Atraente: http://www.youtube.com/watch?v=_6ameIYuCwY

Lua Branca: http://www.youtube.com/watch?v=SdpQi4ceHYA&feature=related















segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

Seis Compositores e Um Intérprete (1836/1900)

1836 - nasce, em Campinas (SP), o compositor Carlos Gomes;




1847 - nasce, no Rio de Janeiro, a compositora Chiquinha Gonzaga;


1859 - Carlos Gomes compõe Quem Sabe?Chiquinha Gonzaga tem 12 anos;

1863 - nasce, no Rio de Janeiro, o compositor Ernesto Nazareth (abaixo) e em São Luis do Maranhão (MA), o poeta, músico e compositor Catulo da Paixão Cearense;


1894 - nasce, no Rio de Janeiro, o cantor e compositor Antonio Vicente Filipe Celestino (foto abaixo);


1896 - morre, no Pará, o compositor Carlos Gomes, aos 60 anos.Chiquinha Gonzaga tem 49 anos e Ernesto Nazareth e Catulo da Paixão Cearense têm 33. Vicente Celestino tem 2 anos;

1897 - nasce, no Rio de Janeiro, o flautista, saxofonista, compositor e arranjador Alfredo da Rocha Viana Filho, o Pixinguinha (foto abaixo, comVinicius de Moraes ao fundo);


1898 - nasce, no Rio de Janeiro, o cantor Francisco Alves (abaixo);

No século XIX nasceram alguns dos precursores da chamada MPB: Carlos Gomes (SP), Chiquinha Gonzaga (RJ), Ernesto Nazareth (RJ), Catulo da Paixão Cearense (MA), Vicente Celestino (RJ), Pixinguinha (RJ) e Francisco Alves (RJ). 


Mesmo não havendo rádio, já se nota a predominância de cariocas na música, sendo apenas um paulista e um maranhense. Além disso, apenas uma mulher. E todos eles ficaram mais famosos por poucas músicas:


Carlos Gomes - Quem Sabe?
Chiquinha Gonzaga - Ó Abre Alas
Ernesto Nazareth - Odeon
Catulo da Paixão Cearense - Luar do Sertão
Vicente Celestino - O Ébrio e Coração Materno
Pixinguinha - Carinhoso
Francisco Alves - como não era compositor, como os outros, Francisco Alves ficou mais famoso por suas interpretações, entre elas Aquarela do Brasil, de Ary Barroso.


Nos próximos posts, um pouco mais desses seis compositores e um intérprete...
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